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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Cápsula do tempo

Ninguém esperava tantos estilos de vinhos doces dos sul-africanos. O país é uma enciclopédia

Provar os vinhos sul-africanos tem sido uma surpresa para o colunista, que só esperava beber tintos potentes e alguns brancos de qualidade. Boas surpresas são sempre melhores que decepções, diria o Conselheiro Acácio.

A maior revelação foi essa categoria de vinhos doces. Começa pelo Vin de Constance, tentativa de recriar um sabor histórico, o dos Moscatéis da região de Constantia, no Cabo, de onde saíam vinhos disputados pelas cortes europeias. A preciosidade encantou reis e czares, Jane Austen, Dickens e o próprio Napoleão.

Mas a praga da filoxera dizimou os vinhedos no final do século 19 e o vinho acabou. Meros 30 anos atrás a família Jooste se empenhou em recuperar sua fórmula. Chegaram ao clone exato de Moscatel, o Muscat de Frontignan, e reproduziram fielmente seu processo de vinificação.

Há sempre enorme risco em confrontar paladares tão diversos, separados por séculos. Quem já comeu Sachertorte em Viena, no Hotel Sacher, onde foi criada, sabe do que estou falando. A torta tem um sabor que saiu de moda, envelheceu, é demasiado neutra, seca e sem graça para nosso julgamento atual, torta museológica. O Constance não é assim, apenas um gosto do passado. Ao contrário, é vivo, cheio da eletricidade de sua acidez equilibrada com boa doçura. Mas tem também um gostinho de gaveta antiga, um toque de coisas remotas, vinho vitoriano, curioso, amável como operetas, senhoritas que desmaiavam e as sensibilidades sociais de Proust. Equivale a um passeio líquido na máquina do tempo.

O clima favorável e a pluralidade de uvas que se dão bem no país permitem outros atrevimentos, igualmente com homenagens napoleônicas. Jean-Vincent Ridon, enólogo francês, decidiu fazer um Tokaj (como um húngaro concentrado, com 6 puttonyos!) e chamou-o Mathilde. Sendo francês fez também um Créme de Tête no estilo Sauternes e um Vin de l’Empereur, vin doux naturel (com direito ao brasão imperial de Napoleão no rótulo). São bons? São. Não se parecem muito aos originais, mas eles mesmos são tão originais que valem a pena.

E Danie de Wet, igualmente cultor de riscos, faz vários, o melhor deles, um colheita tardia de botritis usando Riesling.

Luiz Horta, blog.estadao.com.br/blog/luiz-horta

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